Capítulo 11 - Pelo menos batata-doce tem um monte de vitamina a

25-02-2012 20:42

 

— Os dela. Sem dúvida nenhuma, os dela — sussurrou Hanna, apontando.

— Não. São muito pequenos! — Mona sussurrou de volta.

— Mas olha como estão estufados na parte de cima! Completamente falsos — retrucou Hanna.

— Acho que aquela mulher ali operou a bunda.

— Que horror! — Hanna franziu o nariz e passou as mãos pelas laterais de seu bumbum perfeitamente torneado, para ter certeza de que ele continuava totalmente perfeito. Era fim de tarde da quarta-feira, faltando apenas dois dias antes da festa campestre anual de Noel Kahn, e ela e Mona estavam esparramadas no terraço externo da Yam, a cafeteria orgânica do clube de campo dos pais de Mona. Abaixo delas, um bando de meninos de Rosewood jogava uma partida rápida de golfe antes do jantar, mas Hanna e Mona estavam jogando um jogo diferente. Ache os Seios Falsos. Ou qualquer outro negócio falso, já que havia montes de coisas falsas por ali.

— Sim, parece que o cirurgião plástico dela fez uma barbeiragem — murmurou Mona. — Acho que minha mãe joga tênis com ela.Vou perguntar.

Hanna olhou de novo para a mulher pequenina, de trinta e poucos anos, que estava no bar, cujo traseiro parecia suculento demais para um corpo magrinho que nem um palito de dentes.

— Eu morro antes de fazer uma cirurgia plástica.

Mona brincou com sua bela pulseira da Tiffany's que, é claro, ela não teve de devolver.

—Você acha que Aria Montgomery operou os dela?

Hanna olhou para ela, pasma.

— Por quê?

— Ela é mesmo magra, e eles são, tipo, perfeitos demais — disse Mona. — Ela foi para a Finlândia, alguma coisa assim, não foi? Ouvi dizer que na Europa eles turbinam peitos por preços bem camaradas.

— Não acho que eles sejam falsos — murmurou Hanna.

— Como é que você sabe?

Ela deu uma chupada no canudinho. Os peitos de Aria sempre foram daquele jeito — ela e Aria foram as únicas duas meninas que precisaram de sutiã no sétimo ano. Ali sempre exibiu os dela, mas a única vez que Aria pareceu notar que tinha peitos foi quando ela tricotou sutiãs para todas como presente de Natal e teve que fazer o dela num tamanho maior.

— Ela apenas não parece ser desse tipo — respondeu Hanna.

Falar com Mona sobre suas antigas amigas era uma coisa estranha. Ela se sentia mal sobre como ela, Ali e todas as outras costumavam provocar Mona no sétimo ano, mas sempre pareceu esquisito discutir essas coisas.

Mona olhou para ela.

—Você está bem? Parece diferente hoje.

Hanna hesitou.

— Pareço? Como?

Mona deu um sorrisinho falso.

— Opa, alguém está nervosinha.

— Eu não estou nervosinha — disse Hanna, rapidamente. Mas ela estava. Desde a passagem pela delegacia e o e-mail da noite anterior, estava pirando. Naquela manhã, seus olhos pareciam mais de um tom de castanho opaco que verdes, e seus braços pareciam distorcidos, inchados. Ela tinha uma sensação horrível de que estava mesmo sofrendo uma transformação morfológica de volta ao que era no sétimo ano.

Uma garçonete loura, que parecia uma girafa, as interrompeu.

—Vocês já decidiram?

Mona olhou para o cardápio.

— Eu vou querer a salada de frango asiática, sem molho.

Hanna limpou a garganta.

— Eu quero a salada jardineira com brotos, sem molho e uma porção grande de batata-doce frita. Numa embalagem para viagem, por favor.

Assim que a garçonete levou os menus, Mona puxou os óculos de sol para a ponta do nariz.

— Batatas-doces fritas?

— É para minha mãe — respondeu Hanna, depressa. — Ela vive disso.

Lá embaixo, no campo de golfe, um grupo de meninos mais velhos acertava a bolinha para lançá-la longe, perto de um rapaz jovem e bonito, de bermudas. Ele parecia um pouco deslocado com seu cabelo bagunçado, bermudão cargo e... aquilo era uma... camiseta polo da polícia de Rosewood? Oh, não. Era mesmo.

Wilden deu uma geral pelo terraço e acenou ao ver Hanna. Ela afundou na cadeira.

— Quem era aquele? — ronronou Mona.

— Ah... — Hanna balbuciou, com metade do corpo debaixo da mesa. Darren Wilden era um golfista? Dá um tempo. Nos tempos de ensino médio, ele era do tipo que tirava o maior sarro dos caras da equipe de golfe de Rosewood. O mundo todo estava contra ela?

Mona deu um grito.

— Peraí um pouquinho. Ele não era da nossa escola? — Mona sorriu. — Ah, meu Deus. Ele é o cara da equipe de mergulho. Hanna, sua vaca! Como é que ele conhece você?

— Ele... — Hanna fez uma pausa. Passou a mão pelo cós do jeans. — Eu o conheci na trilha Marwyn, uns dias atrás, quando estava correndo. Nós paramos na fonte ao mesmo tempo.

— Legal — disse Mona. — Ele trabalha por aqui?

Hanna fez mais uma pausa. Ela queria muito evitar isso.

— Hum... acho que ele disse que era policial. — Ela fingiu desinteresse.

—Você está de brincadeira. — Mona tirou o protetor labial Shu Uemura da sua maxibolsa de couro azul e o passou 'suave' mente na boca. — Aquele cara é gostoso o suficiente para estar naqueles calendários da polícia. Posso até ver: Senhor Abril. Vamos perguntar se podemos ver o cassetete dele.

— Shhhh — disse Hanna.

As saladas delas chegaram. Hanna colocou a embalagem de isopor com as batatas-doces fritas de lado e comeu um tomate-cereja.

Mona se inclinou para mais perto dela.

— Aposto que você consegue um encontro com ele.

— Com quem?

— Com o Senhor Abril, com quem mais?

Hanna bufou.

— Claro.

—Você deveria levá-lo para a festa do Kahn. Ouvi dizer que alguns policiais foram à festa dele ano passado. É por isso que elas nunca são impedidas de acontecer.

Hanna se recostou. A festa de Kahn era uma tradição lendaria em Rosewood. Os Kahn viviam em uma terra de quinhentos mil metros quadrados e os filhos dos Kahn — Noel era o mais novo — davam uma festa de volta às aulas todos os anos. Os garotos invadiam a adega muito bem guarnecida dos pais, que ficava no porão, e sempre acontecia algum escândalo. No ano anterior, Noel atirara na bunda de seu melhor amigo, James, com uma arma de ar comprimido, porque James tentara beijar a namorada dele, Alyssa Pennypacker. Os dois estavam tão bêbados que riram durante todo o trajeto para o pronto-socorro e não conseguiam se lembrar como ou por que tinham ido parar lá. No ano anterior a esse, um bando de viciados, que já tinham passado da conta, tentou fazer com que os cavalos do sr. Kahn fumassem um narguilé.

— Não. — Hanna mordeu outro tomate. — Acho que eu vou com Sean.

Mona fez uma careta.

— Por que desperdiçar uma noite de festa perfeita com o Sean? Ele fez um pacto de virgindade! É provável que nem apareça lá.

— Só porque você assina um termo de virgindade não significa que vai parar de curtir. — Hanna pegou uma garfada enorme de salada, enfiando os vegetais secos e com gosto de nada na boca.

— Bem, se você não vai convidar o sr. Abril para a festa de Noel, eu vou. — Mona se levantou.

Hanna a segurou pelo braço.

— Não!

— Por que não? Qual é, seria legal.

Hanna enterrou as unhas no braço de Mona.

— Eu disse não.

Mona se sentou e fez bico.

— Por que não?

O coração de Hanna estava acelerado.

— Tudo bem. Você não pode contar a ninguém. — Ela respirou fundo. — Eu o conheci na delegacia de polícia, não na trilha. Fui chamada para ser interrogada sobre aquele negócio da Tiffany's. Mas não foi grande coisa. Eu não fui fichada.

—Ai, meu Deus! — Mona gritou. Wilden olhou para cima de novo.

— Shhh! — pediu Hanna.

— Mas você está bem? O que aconteceu? Me conta tudo! —Mona sussurrou de volta.

— Não há muito o que contar. — Hanna jogou o guardanapo sobre o prato. — Eles me levaram para a delegacia, minha mãe foi comigo e nós ficamos sentadas lá um pouco. Eles me deixaram ir embora com uma advertência. Sei lá. A coisa toda deve ter durado uns vinte minutos.

— Credo. — Mona lançou um olhar incompreensível para Hanna que, por um segundo, se perguntou se não seria de pena.

— Não foi, tipo, dramático, nem nada — continuou Hanna, na defensiva, a garganta seca. — Não aconteceu muita coisa. A maioria dos guardas estava no telefone. Eu passei o tempo todo mandando torpedos. — Ela deu uma parada, considerando se devia ou não contar a Mona sobre o torpedo "Ele vai dizer não" que ela recebera de A, fosse quem fosse A. Mas para que desperdiçar seu fôlego? Aquilo podia não significar nada, não é?

Mona deu um gole em sua Perrier.

— Pensei que você jamais seria pega.

Hanna engoliu em seco.

— Pois é.

— Sua mãe acabou com a sua raça?

Hanna desviou o olhar. Na volta para casa, a mãe perguntou a ela se tivera mesmo a intenção de roubar a pulseira e os brincos. Quando Hanna respondeu que não, a sra. Marin disse:

— Ótimo. Tudo resolvido, então. — Então abriu o celular e fez uma ligação.

Hanna deu de ombros e se levantou.

— Acabo de me lembrar que preciso levar Dot para passear.

— Tem certeza de que está bem? — perguntou Mona. — Seu rosto está um pouco manchado.

— Não é nada demais. — Ela deu um beijinho em Mona e se virou para sair.

Hanna saiu do restaurante desfilando, mas, assim que chegou ao estacionamento, começou a correr loucamente. Entrou em seu Toyota Prius — o carro que a mãe comprara para si mesma no ano anterior, mas que, recentemente, dera para Hanna porque se cansara dele — e checou o rosto no espelho. Havia horrorosas, odiosas placas vermelhas em suas bochechas e testa.

Depois de toda a sua mudança, Hanna se tornara neurótica não apenas em parecer descolada e perfeita todo o tempo, mas em ser descolada e perfeita também. Morrendo de medo de que o menor erro pudesse mandá-la direto de volta para o reino dos perdedores, ela se preocupava com os mínimos detalhes, com coisas pequenas, como ter o nome perfeito na tela de torpedos e qual era a seleção certa de músicas para ouvir em seu carro, até coisas grandes, como quais eram as pessoas certas a serem convidadas para dormir em sua casa depois da festa de al-guém e qual o garoto perfeito para sair — que, por sorte, era o mesmo menino que amava desde o sétimo ano. Ser pega por roubar em uma loja mancharia a reputação da Hanna perfeita, controlada e superdescolada que todo mundo conhecia? Ela não soubera ler no olhar de Mona o que ela quisera dizer com "Credo". Será que ela quisera dizer "Credo, mas e daí?" ou "Credo, que idiota!"?

Ela ficou pensando que talvez não devesse ter contado para Mona tudo o que acontecera. Só que... alguém já sabia. A.

Você sabe o que o Sean vai dizer para você?

Ele vai dizer não.

O campo de visão de Hanna ficou embaçado. Ela apertou o volante por alguns segundos, depois virou a chave na ignição, saiu do estacionamento do Country Clube e entrou em uma rua sem saída, de pedregulhos, bem calma, a poucos metros da estrada. Ela podia ouvir seu coração disparando enquanto desligava o carro e respirava fundo. O vento tinha cheiro de grama recém-cortada.

Hanna fechou os olhos com força. Quando os abriu, avançou para a embalagem de batatas-doces fritas. Não, ela pensou. Um carro passou zunindo pela estrada principal.

Hanna limpou as mãos na calça. Deu outra olhada para a embalagem. As batatas tinham um cheiro delicioso. Não, não, não.

Ela pegou a embalagem e abriu a tampa.

O cheiro doce e morno atingiu seu rosto. Antes que pudesse se controlar, Hanna enfiou uma porção enorme de batatas na boca. As batatas ainda estavam tão quentes que queimaram sua língua, mas ela não ligou. Era um alívio tão grande; essa era a única coisa que a fazia se sentir melhor. Ela não parou até comer todas as batatas e lamber as laterais da embalagem para aproveitar até o último grão de sal que ficara ali.

Logo em seguida ela se sentiu muito, muito mais calma. Mas assim que voltou para a estrada principal, aqueles sentimentos familiares de sempre, pânico e vergonha, se instalaram dentro dela. Hanna impressionou-se porque, apesar de fazer muitos anos que ela se comportava assim, a sensação era sempre a mesma. Seu estômago doía, sentia que suas calças estavam apertadas e tudo o que queria era se livrar do que estava dentro dela.

Ignorando os latidos estridentes de Dot em seu quarto, Hanna disparou escada acima até o banheiro, bateu a porta e caiu no chão frio. Deu graças a Deus por sua mãe ainda não ter chegado do trabalho. Pelo menos, ela não poderia ouvir o que Hanna ia fazer.