Capítulo 17 - Pato, Pato, Ganso!

26-02-2012 11:11

 

— Tudo bem.—Aria soprou sua franja comprida para tirá-la dos olhos. — Nessa cena, você tem que usar essa peneira na cabeça e falar muito sobre um bebê que nós não temos.

Noel franziu o cenho e colocou o dedão em sua boca rosada em formato de arco.

— Por que eu tenho que usar uma peneira na cabeça, Finlândia?

— Porque sim — respondeu Aria — é Teatro do Absurdo. Por isso ele é, tipo, absurdo.

— Saquei — Noel riu. Era sexta-feira de manhã e eles estavam na sala de inglês. Depois do desastre de Esperando Godot, no dia anterior, o novo trabalho passado por Ezra consistia em os alunos se dividirem em grupos e escreverem suas próprias peças existencialistas. Existencialista era outro jeito de dizer "bobo e fora do padrão". E se existia alguém que podia ser bobo e fora do padrão, esse alguém era Aria.

— Eu sei de uma coisa realmente absurda que nós podemos fazer — disse Noel. — Nós podemos ter um personagem que dirige um Navigator e, tipo, depois de umas duas cervejas, cai num lago com patos. Mas ele, tipo assim, cai enquanto dirige, então não percebe que está no lago até o dia seguinte. Podia ter patos dentro do Navigator.

Aria fez cara de preocupada.

— Como a gente vai encenar isso? Parece impossível.

— Eu não sei. — Noel deu de ombros. — Mas isso aconteceu comigo ano passado. E foi mesmo absurdo. E incrível.

Aria suspirou. Ela não havia escolhido Noel para ser seu parceiro porque achava que ele seria um bom coautor. Ela olhou em volta procurando por Ezra, mas ele, infelizmente, não estava olhando para eles como se estivesse com ciúmes.

— E se nós fizermos uma das personagens pensar como um pato? — sugeriu ela.— Ele pode dizer um quack de vez em quando.

— Hum, claro. — Noel anotou aquilo num papel pautado com uma caneta Montblanc toda mordiscada. — Ei, talvez nós pudéssemos filmar isso com a câmera Canon DV do meu pai. Daí a gente fazia um filme em vez de uma peça chata.

Aria pensou bem.

— Na verdade, isso seria bem legal.

Noel sorriu.

— Aí, poderíamos manter a cena do Navigator!

—Acho que sim. —Aria se perguntou se os Kahn realmente teriam um Navigator de reserva. Era bem provável.

Noel cutucou Mason Byers, que fazia dupla com James Freed.

— Cara, a gente vai usar um Navigator na nossa peça! E fogos de artifício!

— Espera aí. Fogos de artifício?

— Que legal! — respondeu Mason.

Aria ficou calada. Sério, ela não tinha energia para aguentar aquilo. Na noite anterior, ela mal tinha dormido. Estava bastante atormentada com a mensagem em código que recebera, passou metade da noite pensando e tricotando furiosamente uma touca roxa com protetores de orelha.

Era horrível pensar que alguém soubesse não apenas sobre Ezra e ela, mas também sobre aquela história do pai dela. E se esse tal de A enviasse uma mensagens dessas para Ella? Aria não queria que a mãe descobrisse — não naquele momento, não desse jeito.

Aria também não podia evitar a hipótese de que as mensagens de A pudessem mesmo ser de Alison. Simplesmente não havia muitas pessoas que sabiam daquilo. Umas poucas pessoas da faculdade talvez, e Meredith sabia, óbvio. Mas eles não conheciam Aria.

Se o texto era de Alison, aquilo significava que ela estava viva. Ou... não. E se os textos fossem do fantasma de Ali? Um fantasma poderia facilmente deslizar entre as fendas do banheiro feminino do Snooker's. Espíritos dos mortos algumas vezes contatavam os vivos para fazer reparos, certo? Era como uma última missão antes de eles se graduarem no céu.

Se Ali precisasse fazer reparos, porém, podia ter pensado em um candidato mais merecedor que ela.Tipo a Jenna.Aria cobriu os olhos com as mãos, bloqueando a memória. Dane-se a terapia que diz que você tem que enfrentar seus demônios: ela havia tentado bloquear "A Coisa com Jenna" tanto quanto tentara bloquear a história entre seu pai e Meredith.

Aria suspirou. Em horas como essa, ela desejava não ter se afastado de suas velhas amigas. Como Hanna, a umas poucas carteiras de distância — se ao menos Aria pudesse andar até lá e conversar com ela sobre aquilo tudo, fazer perguntas a respeito de Ali. Mas o tempo realmente muda as pessoas. Ela se perguntou se em vez de falar com Hanna, seria mais fácil falar com Spencer ou com Emily.

— Ei, você aí! — Aria se endireitou. Ezra estava em pé na frente dela.

— Oi — guinchou ela.

Seu olhar encontrou os olhos azuis dele, e ela sentiu uma pontada de dor no coração.

Ezra virou o quadril sem jeito.

— Como você está?

— Hum, eu... ótima. Muito bem mesmo. — Ela sentou reta. No avião de volta da Islândia, Aria leu em uma revista Seventeen que encontrou em seu assento que os homens gostavam de garotas confiantes e entusiasmadas. E já que ser brilhante não tinha adiantado no dia anterior, porque não tentar outra abordagem?

Ezra tampou e destampou sua Bic.

— Olha, desculpa cortar você daquele jeito ontem, bem no meio do seu relatório. Você gostaria de me passar seus cartões de resumo, para que eu lhe dê uma nota baseada neles?

—Tudo bem. — Será que Ezra se oferecia para fazer isso pelos outros alunos?

—Tudo bem, então — Ezra sorriu. Ele abriu a boca como se quisesse dizer mais alguma coisa. — Você está conseguindo alguma coisa, aí? — Ele colocou as mãos na carteira de Aria e se inclinou para olhar o caderno dela. Aria olhou para suas mãos nesse momento, depois encostou seu mindinho no dele. Ela tentou fazer parecer acidental, mas ele não tirou a mão dali. Pareceu que o contato entre eles gerava eletricidade.

— Sr. Fitz! —A mão de Devon Asliss se ergueu na última fileira. — Eu tenho uma pergunta.

— Fique aí — disse Ezra, se levantando.

Aria colocou o dedinho que havia encostado em Ezra na boca. Olhou para ele por alguns segundos, pensando que ele poderia voltar para ela, mas não voltou.

Tudo bem, então. De volta ao plano C: ciúme.

Ela se virou para Noel.

— Acho que deveria ter uma cena de sexo em nosso filme.

Ela falou aquilo bem alto, mas Ezra continuava inclinado sobre a carteira de Devon.

— Sensacional — disse Noel. — O cara que pensa que é um pato vai conseguir alguma coisa?

— É isso aí. Com uma mulher que beija como um ganso.

Noel riu.

— Como é que um ganso beija?

Aria se virou na direção da carteira de Devon. Ezra estava de frente para eles. Ótimo.

— Assim. — Ela se inclinou e beijou Noel no rosto. Surpreendentemente, Noel tinha um cheiro muito gostoso. Ele cheirava a creme de barbear Kiehl's Blue Eagle.

— Legal — sussurrou Noel.

O restante da classe fervilhava de atividade, sem se dar conta dos beijos de ganso, mas Ezra, que ainda estava perto da carteira de Devon, permaneceu imóvel.

—Você sabe que eu vou dar uma festa hoje à noite? — Noel colocou a mão no joelho de Aria.

— É, acho que ouvi alguma coisa a respeito.

—Você deveria mesmo ir. Vamos ter muita cerveja. E outras coisas... como uísque. Você gosta de uísque? Meu pai tem uma coleção, então...

— Adoro uísque — Aria sentiu os olhos de Ezra queimando em suas costas. Então ela se inclinou sobre Noel. — É claro que eu vou à sua festa hoje à noite.

Pela forma como a caneta dele escorregou de sua mão e fez barulho ao cair no chão, não era difícil adivinhar se Ezra tinha ou não escutado o que eles diziam.